Moradores fogem de suas casas durante reintegração de posse pela PM; durante a ação, pessoas foram feridas, agredidas, torturadas, violentadas sexualmente e mortas |
O criminoso Naji Nahas, "dono" do terreno do Pinheirinho |
Uma coisa que contribui para essa situação é a nossa antiquada lei de drogas. Não é um juiz, mas o próprio policial quem determina se a quantidade de drogas que a pessoa porta a caracteriza como usuário ou traficante. Soma-se a isso o fato de que muitas vezes os flagrantes são forjados e pronto, qualquer um pode ser mandado para o inferno das prisões paulistas e passar, quem sabe, anos de sua vida ali dentro, sem mais nem menos, por puro preconceito de cor e classe, para o cumprimento de metas mensais, por perseguição político-ideológica ou simplesmente por engano. Quando sair, não sairá o mesmo.
Esse estado de terror é ainda maior quando percebe-se que muitas vezes essa força policial, que é maior que o Exército Brasileiro (e com licença para matar, bater e prender), é usada para defender sórdidos interesses privados e que a maioria esmagadora dos homens por trás das fardas está pronta para obedecer friamente sua cadeia de comando, sem questionar, em ações absurdas como as vistas no último dia 22, quando 2.000 homens da PM paulista com armas letais, cavalos e helicópteros tomaram o Bairro Pinheirinho, em São José dos Campos, cidade próspera e conhecida por sua indústria bélica e aeroespacial. Pinheirinho era um bairro onde viviam 1.700 famílias, erguido há anos em um terreno que pertence à massa falida de uma empresa de Naji Nahas - uma pesquisa no Google ou nas páginas dos noticiários econômico e policial da época poupam apresentações.
PARTE 2
Polícia expulsa moradores do Pinheirinho, em São José dos Campos |
Não. Não foi um terremoto. Não foi furacão nem deslizamento. Foi o Estado que aconteceu naquele bairro em que viviam 1.700 famílias (seis mil pessoas, entre homens, mulheres e crianças). Pinheirinho é um bairro de São José dos Campos, um pedaço do interior de São Paulo.
Antigamente (ou ingenuamente por muitos ainda hoje) São Paulo era visto como um lugar de progresso, de horizontes, de lei. Em São Paulo, nossa patética prepotência paulista nos fazia ver outros lugares do Brasil (Norte, Nordeste e Centro-oeste, de modo especial) como território atrasado e violento. Infelizmente uma parte disso não é mentira, ainda me vêm à mente pistoleiros e matadores de aluguel (os famosos jagunços) quando penso no Mato Grosso (a postura dos ruralistas mato-grossenses e o genocídio guarani kaiowá só comprovam isso). Quando penso na Bahia, penso ainda em oligarquias centenárias de coronéis (o que a imortalidade de alguns sobrenomes no Congresso só ratificam). O que muda é que não tenho mais São Paulo. Um vendaval varreu o cenário do teatro. Pane na “Matrix”. Ou como diria o rapper Criolo: “Não existe amor em SP”.
Os rios em que brinquei não existem mais. Tampouco temos comida plantada aqui, tudo vem de fora. Do Pontal do Paranapanema ao Vale do Ribeira, do Litoral à Alta Mogiana, tudo é monocultura. Morei, amei, trabalhei e estudei e andei por muitas cidades de São Paulo. Pela janela do ônibus vejo um deserto verde, sempre. Cana e mais cana por vastas áreas maiores que muitos países europeus, tudo pertencente a pouquíssimos usineiros que, mesmo sendo milionários, ainda são clientes “estilo” de bancos públicos e conseguem as melhores taxas e perdões do mercado. Na maioria das cidades consolidam-se hegemonias políticas graças a alianças imorais.
As universidades públicas estão sendo privatizadas aos poucos. As pesquisas são cada vez mais direcionadas a gerar patentes para a iniciativa privada, não em gerar conhecimento e avanços para a sociedade que as financia. Que dizer das imorais parcerias da Monsanto com os campi de agronomia da Unesp? Ou da Andrade Gutierrez e a Votorantin ditando a formação dos alunos da Unicamp? Na USP o reitor, pela primeira vez em tempos de "democracia", não foi o eleito pela maioria da comunidade acadêmica, mas João Grandino Rodas, segundo colocado nas eleições, pois assim quis o governador (que em última instância é quem decide).
Cabeças pensantes, pessoas que querem dar maior sentido às suas vidas, pessoas com sonhos e vontade de fazer algo de bom (e há muitos desses em universidades) obviamente se opõem a esse caminho. E o Estado (mero balcão de negócios dos grandes capitalistas) faz o que quanto a isso? Polícia. A imprensa bandeirante diz que a Polícia está ali para defender as pessoas de roubos e estupros e que os estudantes que contestam isso só querem saber de fumar maconha. A “opinião pública” acredita. Pouco tempo depois, e a mídia televisiva não mostra, mas alguém filma e põe na internet um aluno negro sendo espancado por um policial por puro racismo (e por participar de centro acadêmico).
A TV não mostra, a Folha e o Estadão também não dão bola, mas poucos dias depois uma aluna da USP é vítima de estupro. Autor do crime: Renato Guimarães da Silva, soldado da PM há 20 anos.
Penso no Pinheirinho. Nas crianças que nasceram e viveram e só conheciam aquele lugar como casa, agora estão em galpões que lembram campos de concentração, comendo comida estragada. Penso no Naji Nahas, especulador, golpista, milionário. Deve aos cofres públicos, mas é sempre mais fácil pagar as pessoas que guardam as chaves dos cofres públicos do que aos próprios cofres públicos. E então o Estado age como hunos, ou como os cavaleiros de Gengis Khan contra uma comunidade de seu próprio povo. Só para defender interesses privados de um canalha. Os jagunços daqui andam fardados.
São Paulo está sitiada. É refém de uma gangue que está muito acima dos partidos. É refém da violência. E não podemos chamar a Polícia.
Se pudesse gritar alguma coisa para o resto do Brasil seria: "Socorro!" e "não queiram esse 'progresso'".
MAIS
FAVELA MOINHO: uma favela fundada por catadores de material reciclável foi víma de um incêndio no inicio do ano. Segundo a imprensa o incêndio foi acidental e morrenrem 2 pessoas. Segundo os moradores, morreram 40 e o incêndio foi criminoso, cometido deliberadamente pelas máfias de especulação imobiliária que controlam a prefeitura, com o intuito de desocupar o terreno pra depois empreiteiras construirem arranha-céus de luxo. Veja depoimento de morador.
MAIS
FAVELA MOINHO: uma favela fundada por catadores de material reciclável foi víma de um incêndio no inicio do ano. Segundo a imprensa o incêndio foi acidental e morrenrem 2 pessoas. Segundo os moradores, morreram 40 e o incêndio foi criminoso, cometido deliberadamente pelas máfias de especulação imobiliária que controlam a prefeitura, com o intuito de desocupar o terreno pra depois empreiteiras construirem arranha-céus de luxo. Veja depoimento de morador.
Eu Queria matar a presidenta
Esse video acima, sobre o massacre de Pinheirinho foi feito pelo jornalista independente Pedro Rios, que inconformado com o silêncio da mídia oficial sobre o absurdo caso, iniciou uma greve de fome acorrentado em frente ao prédio da Rede Globo, no Rio.
No Arquivo Viagem no Tempo
"Da Luz às Trevas" A verdade por trás da "cracolândia"
Parabéns pelo texto. De fato, o Carandiru não acabou. Ele "foi" para o interior.
ResponderExcluir[]'s
Os defensores dos direitos humanos encheram o saco com pinheirinhos onde não morreu ninguém.
ResponderExcluirNa Bahia já morreram mais de 80 e não vejo o mesmo empenho em divulgar.