De 15 a 19 de novembro de 1889, essa foi a bandeira provisória da República; Faz tempo que nosso Estado gosta de copiar um outro império autoritário |
causada por especuladores e pelas corporações financeiras que tomaram lentamente, sobretudo no pós-Guerra Fria, o controle dos seus estados. Aos poucos, de maneira catalisada pelas novas formas de distribuição de informação (ver também: Wikileaks, Revolução 2.0), povos do mundo começam a descobrir que os governos de seus países não são exatamente os seus governos, que esse sistema não se sustenta.
À 66ª Assembleia Geral das Nações Unidas, o presidente dos Estados Unidos da América chega com a consciência de que a força da voz não é nem de longe tão respeitada (e/ou temida) quanto há 10 anos atrás. Ironicamente, as boias que impedem o sistema econômico hegemônico globalizado de afundar são países até recentemente periféricos, os "emergentes" do hemisfério sul, como Brasil, Índia e África do Sul (ao lado do cartelizado estado capitalista Russo, que surgiu dos escombros da URSS e do monolítico capitalismo de estado chinês). A crise sistêmica, se ainda não levou ao colapso total da Era da Especulação, já provocou o deslocamento do eixo econômico da Terra. O ganho de força da postulação do Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança tem tudo a ver com isso.
Diante das recentes transformações no tabuleiro econômico, o poder político nas relações internacionais também se reconfigura. Ou os Brics salvam o capitalismo ou nada será como antes. Sabendo da posição privilegiada que lhe caiu no colo, os representantes dos governos dessas economias se veem em confortável situação de falar alto com os estados "submergentes".
Então cabe, pela primeira vez, a uma mulher abrir os debates da Conferência Geral da ONU. A presidenta do Brasil, ex-guerrilheira de esquerda que há poucas décadas combatia a ditadura em nosso país que era sustentada por Washington. Mas naquela manhã de setembro ela não falaria em revolução ou rompimento com a ordem hegemônica, mas em ajustes e reformas para manter o monstro em pé: “O mundo vive um momento extremamente delicado e, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade histórica. Enfrentamos uma crise econômica que, se não debelada, pode se transformar em uma grave ruptura política e social. Uma ruptura sem precedentes, capaz de provocar sérios desequilíbrios na convivência entre as pessoas e as nações. Mais que nunca, o destino do mundo está nas mãos de todos os seus governantes, sem exceção. Ou (nós, os governos dos Estados) nos unimos todos e saímos, juntos, vencedores ou sairemos todos derrotados”.
Protestos na Espanha por democracia direta, contra a ditadura dos bancos, eram acompanhados de debates e propostas para uma nova ordem |
Gozado que um grupo surgido da esquerda latino-americana é que esteja se prestando a esse papel. Vale lembrar que ante à crise sistêmica, nossa posição de “emergente” ou mesmo “líder” não é segurança para nada. Esse choque recente de capitalismo pelo qual temos passado (que facilita o acesso ao crédito bancário e incentiva o consumo de bens não duráveis – como carne uma vez a mais por semana) pode ser tão efêmero quanto o foram o da Espanha e o da Grécia. Nos anos 90, a Espanha era um verdadeiro canteiro de obras; o país que mais crescia na Europa até organizou Jogos Olímpicos e o mesmo se sucedeu com a Grécia uma década mais tarde.
Nem estatizante, nem liberal. O modelo de jogo proposto pelos novos ricos consiste em preservar um Estado (com democracia de fachada, de preferência) para socorrer os interesses do capital privado em momentos de crise. É o capitalismo se reinventando após a trágica era neoliberal. Tática que parece ignorar que mais do que sistêmica, a crise é civilizatória (falaremos sobre isso mais adiante).
No meio disso tudo, do total rearranjo das forças políticas do mundo capitalista pós-globalização (que pode incluir até o justo e aguardado reconhecimento do Estado palestino por parte da ONU), o Brasil, novo protagonista, tenta marcar posição e, a exemplo de outras potências regionais (como Irã e Inglaterra), também esconde suas graves contradições.
Simultaneamente, enquanto Dilma fazia seu discurso histórico na ONU, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) aprovava o Código Florestal sem debater os problemas de Constitucionalidade do projeto. Eram mais de 90 emendas propostas na Comissão. O relator da CCJ, senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC) sequer leu as propostas nem quis debatê-las. Rogou a seus pares que aprovassem o relatório tal como estava. E assim foi feito. A mais importante das comissões do Senado simplesmente abdicou de fazer seu trabalho, corrigir o que fosse injusto e/ou inconstitucional, justamente nesse que é um dos temas mais importantes que já tramitou naquela casa desde a "Redemocratização". Pra que ela existe então? Por que eles são votados e pagos? Nem mesmo discutir!? Não era nosso direito (e das gerações que herdarão a Terra) que eles pelo menos debatessem as emendas?
Os Estados Unidos não têm um sistema público de Saúde. O Chile não tem universidades públicas. O Brasil, por sua vez, não tem sequer um Poder Legislativo público. O interesse privado, o poder econômico, parece estar acima de tudo isso. Ainda assim, Dilma falava ao mundo (e convencia boa parte dele) como se fosse a líder de um país democrático. Não é.
É verdade que o tabuleiro global mudou bastante nos últimos 10 anos, a ponto de hoje ser o Brasil quem pode emprestar dinheiro (via FMI) a países da Europa. Mas é preciso deixar claro que quem tem crescido não é o Brasil, mas a concentrada economia brasileira. Eike Batista, por exemplo, foi o homem que mais enriqueceu no mundo no ano passado e hoje sua fortuna beira os R$ 50 bilhões.
Aos brasileiros coube um aumento do acesso ao crédito. Agora está mais fácil pegar dinheiro emprestado e cada vez mais as pessoas estão financiando a longo prazo casas e carros novos. Houve também um pequeno incremente na renda, e no grau consumo, que pode muito bem ser ilustrada com o aumento de 11,7% da venda de bebidas em lata só em 2009. Mas tomar refrigerante não quer dizer que estamos participando da festa, mas para muitos cria a ilusão de ascensão social das camadas populares, mesmo que ESTRUTURALMENTE as coisas não se inverteram por aqui e a maioria dos brasileiros continua vulnerável economicamente a médio prazo, ainda mais diante de uma crise que, mais que econômica é sistêmica; e mais que sistêmica, é civilizatória. T inchaço das bolhas especulativas, sobretudo a bolha imobiliária (sobre isso ver como começou a crise em 2008 e a quebra do Lehman Brothers).
A questão é que esse “bom momento” do Brasil (isso é, desse bom momento do Capitalismo no Brasil) tem feito as pessoas perderem completamente o senso crítico. As camadas populares não enxergam a arapuca em que se enfiam ao se endividar a esse nível, não se incomodam com corrupção, nem com a devastação ambiental, nem com o aumento da violência do Estado contra os povos indígenas.
Em tudo estamos cada vez mais parecidos com os EUA há 10 anos, não só por ter agora nossos próprios assassinos escolares. Somos genocidas: basta ver a questão de Belo Monte. Promovemos violência mundo a fora: basta ver a repressão violentíssima das forças policiais na Bolívia contra os indígenas que protestaram contra a construção de uma rodovia passando pela terra deles e destruindo a floresta, rodovia essa financiada pelo BNDES, executada por uma empreiteira brasileira para ligar o Brasil a portos do pacífico. Ou então basta olhar a crescente insatisfação dos haitianos ante os abusos dos soldados da missão comandada pelo Brasil.
Enquanto americanos começam a acordar do transe capitalista, no melhor estilo Praça Tahrir, ocupam Wall Street há 13 dias, por reformas políticas rumo à democracia direta e por mudanças profundas no sistema econômico, o Brasil ambiciona ser a nova potência prepotente e copia até a cara de pau do Tio Sam de se autoproclamar “Voz da Democracia” (mesmo não tendo sequer um congresso representativo que discuta a coisas e ouça as pessoas). Tomemos cuidado: quanto maior a altura, maior a queda. E mais, se o novo século é do Brasil, podemos fazer melhor que eles fizeram e propor um outro modelo de civilização.
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análise da crescente insatisfação dos haitianos contra os abusos cometidos pelas tropas comandadas pelo Brasil
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